quarta-feira, 6 de junho de 2007

Brutalidades

Veio aquele garoto de calça rasgada, camisetão e boné preto responder a ela, com ar de importância: "não é que eu não precise mais de você; é só que eu sinto que não estamos em pé de igualdade". "Como assim?". "Se quer saber, eu gosto muito mais de você do que você de mim, então achei melhor não me gastar sem que haja retorno". Ela deu as costas e foi embora.
E o que sabia ele sobre aquele tipo de atitude? Tinha todos os dados anotados na cabeça: a data do aniversário, a data do princípio de tudo que tinham, as roupas que preferia, o que gostava de ouvir, de dizer nas brigas para ofender, de dizer pra chamar atenção. No entanto, há sempre algum percalço, algo que não se decifra - apesar de ali, constante - e o do momento era essa sensação de que alguma coisa no sentimento mudara.
Havia algumas semanas, ele reparara que os bons dias diminuíam de quantidade e de intensidade. Brigas são comuns. O que não é comum é aquilo de perder a vontade de ver. E algo o avisava de que essa vontade dela pensava muito, fato que o convenceu a colocá-la na parede e, em cisma, fazê-la confessar o quer que fosse ou não fosse.
Relacionamentos de um tempo mais longo que o normal tomavam dois rumos na cabeça dele: ou continuavam, ou retomavam o que não era mais - e o que não era mais significava o final de tudo o que fora: desde a amizade, aquela expectativa do primeiro beijo, aquela cumplicidade que os leigos por aí chamam de namoro até aquela amizade de mentira que sobrevive por um curtíssimo período de tempo após o desmache. Mas fim... Não se podia avançar para retroceder, o que explicava por que as ex's dele eram apenas lembranças de outras épocas, e apenas lembranças.
Só que bate aquele friozinho alarmante na consciência que opina "que merda que eu fiz?!". A medida dos últimos minutos: ele precisava vê-la e conversar. Mas como assim ela andou na direção oposta sem dizer palavra, sem dar satisfação, sem questionamentos? Ah... Uma coisa que o ser humano muito esquece é que nenhum outro ser humano tem a obrigação de considerá-lo, o que ele bem sabia, mas ignorava porque... bom... porque o tal do amor tudo pode. E foi ele quem fez desandar.
"Ah... Não vai poder ser assim a seco. Eu vou fazer algo especial, pra impressionar!". Já mencionei que o cara era rapper? Pois sim, pois sim... Era rapper e foi compor um rap pra raptar sua menina de volta! =0P
*Logo, logo, assim que puder, vou telefonar
Por enquanto tá doendo
E quando a saudade quiser me deixar cantar

Vão saber que andei sofrendo
E agora, longe de mim,
Talvez você possa enfim
Ter felicidade
Nem que faça um tempo ruim
Não se sinta assim
Só pela metade
Ontem demorei pra dormir
Tava assim, sei lá
Meio passional por dentro
Se eu tivesse o dom de fugir pra qualquer lugar

Ia feito um pé de vento
Sem pensar no que aconteceu
Nada, nada é meu
Nem o pensamento
Por falar em nada que é meu
Encontrei o anel que você esqueceu
Aí foi que o barraco desabou
Nessa que meu barco se perdeu

Nele tá gravado só você e eu
Ontem demorei pra dormir
Tava assim, sei lá
Meio passional por dentro
Se eu tivesse o dom de fugir pra qualquer lugar
Ia feito um pé de vento
Sem pensar no que aconteceu
Nada, nada é meu
Por falar em nada que é meu
Encontrei o anel que você esqueceu
Aí foi que o barraco desabou
Nessa que meu barco de perdeu
Nele tá gravado só você e eu
Aí foi que o barraco desabou
Nessa que meu barco se perdeu
Nele tá gravado só você e eu
Aí foi que o barraco desabou
Nessa que meu barco se perdeu
Nele tá gravado só você e eu*
Não era dos melhores, mas ele resolveu que a situação, emergencial do jeito que era, podia gozar de menor capricho. Saiu inseguro; queria aparecer na casa dela de surpresa, pedir desculpas e ouvir explicações que estivessem longe de alcançar o nível de seus receios. Tipo assim "é fase, baby, liga não que passa".
Dizem por aí que há diferentes modos de amar. Ele sempre teve medo de amá-la dum modo diferente do dela, apesar de gostar muito do jeito como ela projetava os dois de dentro pra fora. Contudo, como já dito, há sempre algo de inalcançável em todo ser humano... E demonstrações de afeto projetam apenas um princípio do que seria a coisa toda. Porque nessa vida, diacho!, há limite pra tudo, inclusive para demonstrações. Se não houver limite, a situação passa a envolver brutalidade e brutalidade inclui inconveniências um tanto mais imbecis que aquelas provenientes daquele amor, não amor de sempre, não comum, mas daquele que consegue "funcionar".
Ele temia. Só deus sabe como temia ouvir o que não quisesse naquele instante. Era ali: "eu preciso falar com você!". "O que você quer?". "Dizer que eu fui estúpido. E que compus uma música pra você! E também vim perguntar o que é que você tem pra me dizer e não diz!". "Não tenho nada pra te dizer.". "Tem sim! Eu sei, eu vi! Você me queria mais antes!". "Você também não me olha mais daquele jeito!". "Os olhares mudam! Antes você podia escapar deles, esconder as coisas, agora eles não mentem mais! Eu não tenho a manha de te olhar como um embrulho novo a cada hora que você passa do meu lado.". "Eu tenho saudades disso! Eu procuro por isso, eu quero isso de novo!". "Você tá fazendo birra! Vai me dizer o que é ou não?!". "Tá bom então... Acho que eu não te quero mais...".

Então ele vai questioná-la, exigir satisfações, morrer de ciúme e raiva; ela responderá 3/4 do inteiro ou não. Ambos vão se culpar; talvez um dos lados diga que não foi amor. Talvez ambos os lados falem sobre o que nunca foi, ou o que deixou de ser. Ele vai vomitar a música. Ela vai tentar protegê-lo de sua companhia. Os dois farão tentativas mínimas de reaproximação, nas quais ele se prostrará diante dela com certa sutileza derrotada, uma arrogância de dar pena e más perguntas, e ela meditará certo tempo sobre os seus sentimentos (ou ausência de), com raiva e considerações pequenas acerca daquele menino que um dia a descreveu de um jeito quase certo.
Até que um dia, vencidos pelo cansaço ou pelas tais medidas drásticas, um vire uma vaga lembrança do outro...

*Na verdade: aí foi que o barraco desabou (exaltasamba).

2 comentários:

Anônimo disse...

existe um filme bem legal que vai passar dia 12, meia noite e quinze na tnt..
meu computador agora mostra sua página em alemão.
sabe que eu acho que personagens 'ela' ficam melhores quando narradas em terceira pessoa, enquanto eles são mais interessantes como primeira pessoa? curioso..muito curioso...
(não sei se para publicar o comentário aperto o botão laranja que diz "veroffentlichen" ou o azul que é "vorschau")
vou chutar o laranja. XD

Anônimo disse...

houve essa vez em que o meu celular ficou em alemão... =0D